quinta-feira, 16 de agosto de 2012

No filme... – Roberto Bolaño


No filme na TV o gângster toma um avião
que se levanta lentamente contra um entardecer em preto e branco.
Sentado na poltrona você movimenta a cabeça: na janela
vê o mesmo entardecer, as mesmas nuvens em preto
e branco. Você levanta e cola a mão no cristal:
o reator do gângster abre caminho entre as nuvens,
nuvens incrivelmente lindas, cachos da cabeleira
do seu primeiro amor, lábios ideais que formulam
uma promessa, mas que você não entende.
A imagem que se desloca pelo céu, a imagem
do televisor são idênticas, o mesmo anseio, o mesmo
olhar. E no entanto, você treme e não entende.




Roberto Bolaño nasceu em 1953, no Chile. Roberto Bolaño partiu em 2003, de Barcelona. Roberto Bolaño dispensa apresentações, depois dos livros que deixou, sobretudo seus romances 2666 e Los detectives salvages. Roberto Bolaño publicou em vida um livro de poemas, Três, com três poemas longos, e deixou organizado para publicação A universidade desconhecida, de onde traduzi este poema, com textos escritos entre 1977 e 1993, espécie de "universidade móvel", como ele chamou o livro, testemunho dos anos de formação literária. O vídeo reproduzido nesse post foi feito às margens do rio Sena em um entardecer preto e branco de um julho já meio distante. Na ocasião senti essa tremura diante das nuvens e suas formas mutantes: tudo está ali mas você não entende.

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