segunda-feira, 25 de maio de 2015

Quando cai a noite – Dimitri BR


todo dia
quando cai a noite
você vem
e diz: 
 esperei o dia todo
a noite cair
pra eu vir
uma madrugada
se você não vem
eu fico assim
esperando
a madrugada ir
pra você vir
talvez
amanhã à noite
é outro dia
 a noite vai cair
todo dia
quando cai a noite
você vem
esperei o dia todo a noite cair
todo dia quando cai a noite você vem
quando cai a noite você vem

*
o dimitri br tem um monte de vídeocanções no seu álbum de figurinhas online:

http://www.diahum.com/albumdefigurinhas/ 
fiquei pensando em qual iria postar 
é até difícil escolher um único vídeo para postar
mas esse aqui sempre foi especial porque ainda por cima
tem a gra cantando!

sexta-feira, 22 de maio de 2015

[Perdido. Há uma piscina...] – Pierre Alferi






Perdido. Há uma piscina em algum canto
e num outro um boliche enterrado.
Labirinto é um lugar do qual conhecemos os ângulos,
como se os tivéssemos traçado em outro momento, mas
não identificamos exatamente o ponto em que estamos.
Atrás do Panthéon para o leste, chegando dessa vez
nas ruas Monsieur-le-Prince e Soufflot: é ali,
Q-17 no Indispensável. A máxima mais alegre
seria "você não vai embora até ver tudo".
Acho que sei o nome de cada ruela entre
a rua Mouffetard e a rua Geoffroy-Saint-Hilaire
 grande coisa! Subimos e descemos o tempo todo,
dizemos: pronto, era aqui então. Para penetrar num labirinto,
em sua ideia, é preciso além de tudo excluir a eventual possibilidade
de andar em círculos. Assim, o vendedor de madeira e carvão,
a rua do Puits-de-l'Ermite e, consequentemente, a própria rua
sempre me pareceram ou muito altas ou muito baixas.
Li um artigo sobre as abelhas e os robôs descentrados,
a viagem tranquila de um indivíduo, de uma informação
através de uma colmeia, um cérebro, um país que não tem
mapa. Gosto acima de tudo dos rituais, da miopia,
do que vem por eliminação ou no passo a passo,
o olhar no nível do chão. A rua Mouffetard é uma régua graduada
para toda a região, mas uma regra cujos valores
 uma livraria, o Roi Café, o mercado se invertem logo que eu viro as costas.
O destino, para uma caminhada metódica,
é menos um ponto, aquele digamos onde acaba a rua de la Clef,
do que o preenchimento de casas vazias. Pode-se assim considerar
cada segmento como um parêntese. Ao modo dos turistas
que fazem Creta, eu faço esse lugar. Para completar minha desorientação,

não vi ninguém que tenha me visto, caçador nem explorador.
Na rue Épée-de-Bois, um caminhão transporta as cartas.





















poema originalmente publicado no livro Chemin familiar du poisson combatif (1992)
mas lido nessa antologia para flâneurs
com poemas que falam sobre andar (e se perder) pelas ruas de Paris

o pierre alferi é um poeta e artista francês
o pierre alferi é professor na école de beaux arts
ele escreveu vários livros fez alguns cine-poemas e tem esse blog com seu trabalho
aqui um dos cine-poemas

tive uma dúvida ao traduzir esse poema: o que é Q-17 no Indispensável?
Q-17 pode ser um certificado anti-incêndio
Q-17 pode ser um sistema de câmeras
Q-17 pode ser muitas outras coisas
ainda não consegui decifrar
o que é
nem o Indispensável
que ele fique sendo aqui mais uma medida para me deixar perdida no mapa
por fim poderia ser um ponto no jogo de batalha naval...

ah
e a imagem do henri cartier-bresson
de 1954
é na rue mouffetard
e se chama
en fait
rue mouffetard
embora o menino não tenha a menor pinta de perdido...

quarta-feira, 20 de maio de 2015

[excerto de Ellis Island] – Georges Perec


[Ellis Island, segundo a wikipedia, em 1905]


cinco milhões de emigrantes vindos da Itália

cinco milhões de emigrantes vindos da Irlanda

um milhão de emigrantes vindos da Suécia

seis milhões de emigrantes vindos da Alemanha

três milhões de emigrantes vindos da Áustria e da Hungria

três milhões e quinhentos mil emigrantes vindos da Rússia e da Ucrânia

cinco milhões de emigrantes vindos da Grã-Bretanha

oitocentos mil emigrantes vindos da Noruega

seiscentos mil emigrantes vindos da Grécia

quatrocentos mil emigrantes vindos da Turquia

quatrocentos mil emigrantes vindos dos Países Baixos

seiscentos mil emigrantes vindos da França

trezentos mil emigrantes vindos da Dinamarca



          durante todos esses anos, os navios a
vapor da Cunard Line, da Red Star Line, da
Anchor Line, da Italian Line, da Hamburg-
Amerika Line, da Holland-America Line,
atravessaram o Atlântico norte

        eles partiam de Rotterdam, de Brême, de
Göteborg, de Palerme, de Istambul, de Napoles, de Anvers,
de Liverpool, de Lübeck, de Salonique, de Bristol, de
Riga, de Cork, de Dunkerque, de Stettin,
de Hambourg, de Marselha, de Gênes, de Danzig, de
Cherbourg, de Pirée, de Trieste, de Londres, de Fiume,
de Havre, de Odessa, de Tallin, de Southampton

     eles se chamavam Darmstadt, Furst
Bismark, Staatendam, Kaiser Wilhelm,
Königin Luise, Westerland, Pennland,
Bohemia, Polynesia, Prinzess Irene, Princeton
Umbria, Lusitania, Adriatic,
Cornia, Mauretania, San Giovanni,
Giuseppe Verdi, Patricia, Duca degli Abruzzi,
New Amsterdam, Martha Washington,
Turingia, Titanic,
Lidia, Susquehanna, Albert-Balin
Hansington, Columbus, Reliance, Blücher




       mas a maior parte daqueles que, no fim
da exaustiva viagem, descobriam Manhattan
emergindo da bruma, sabiam que sua prova
não tinha terminado

eles ainda precisavam passar por Ellis Island
ilha que
em todas as línguas da Europa
tinha sido apelidada de A ilha das lágrimas

tränen Insel

wispa lez

island of tears

isola delle lagrime

oстров слез


         é uma pequena ilhota de quatorze hectares,
a algumas centenas de metros da ponta de
Manhattan.
os índios a chamavam de Ilha das Gaivotas
e os holandeses de Ilha das Ostras

[...]




nessa época
quase dezesseis milhões
de homens, de mulheres e de crianças
passaram por Ellis Island
dos quais mais de três quartos
entre 1892 e 1914

nesses anos
chegavam
quase dez mil pessoas por dia

___________________________



trechinho tirado desse livro aí em cima
Ellis Island, de Georges Perec (edição linda da POL)
que conta um pouco sobre a ilha-órgão
que abrigava o controle de imigração nos Estados Unidos até 1914

terça-feira, 19 de maio de 2015

As duas irmãs Cholmondeley da Tate Gallery – Adília Lopes











[The Cholmondeley ladies, 1600, escola britânica, 17th]

Biodegradáveis como a arte

Macabras como fotocópias
de Maria e do bebé



Limão do Entroncamento
dupla esfinge
para os turistas

Quatro trompas de Falópio contentes
que nem ratos

(Eram gémeas
e deram à luz
no mesmo dia
do século XVII)

quarta-feira, 13 de maio de 2015

Charlotte e Véronique (ou todos os rapazes se chamam Patrick) -- Jean-Luc Godard



terceiro curta-metragem do godard
lançado em 1959
pouco antes do acossado
o roteiro é do eric rohmer
com anna colette
nicole berger e jean-claude brialy

terça-feira, 12 de maio de 2015

[alguma chateação frases] – Rafael Mantovani




alguma chateação frases 
ao dizer violeta genciana
circulando     talvez importe fazer

coisas quebradas todos os dias

começar       fechar ali era o fim

começo só que a vida não disse isso

contribui para dar ao filme sua dimensão de filme

dentro       se encontre o fora
e eu penso na resistência e nos resistores na eletricidade
e percebe que saiu do outro lado
ele diz que é muito importante que
em outra língua ela diz
em situações normais já não saberia
então meu passaporte deveria ter validade de 6 meses
entrar no espaço interior equivale a sair?
eu queria dizer que embora buscasse
getrude stein diz
mas aqui não vejo os cacos
mas insistência
na disposição inicial      os documentos poéticos
na vida das pessoas
NÃO
o problema é que não sei o que dizer
o quê
onde estão os cacos?
ou à planta?
perguntas
perguntas      e não definir quem fez
quais recursos        ao lado do corte
quando precisei
que não existe repetição
se existisse podeira poderia ser dos cacos das
talvez importe fazer
talvez porque você estivesse vivendo
também escreveu sobre seu livro achado      o portraits chinois
você entra
você se refere à cor


_______________________

continuando a publicação dos poemas-que-conversam
com-um-teste-de-resistores (leia os outros aqui)
esse aqui é do rafael mantovani
ao ler o livro
o rafael foi anotando alguns versos
e depois colocou em ordem alfabética

o rafael mantovani é tradutor e autor do livro cão (hedra, 2011) 
atualmente o rafael mora em berlim.

a foto que abre o post é da florence henri (fenêtres, 1929).

sábado, 9 de maio de 2015

Ela acha que poesia – Juno Cipolla





[ouça aqui o poema!]



chegar perto
(o microfone em on)
demais nunca é o suficiente

sobre como gatos
sobre como pedestres atravessam
sobre como canetas sempre
falham grafites
de lapiseiras sempre
acabam
(sobre como gatos ronronam)
sobre como quando ontem
atravessei
(a rua)
a rua
para ver a marilia g-
a marilia garcia


SOBRE QUANDO:
Chorei lendo o
Livro da
Marília Garcia
Pedi pra ler
Um poema
Pensei em escrever
Um poema (pra ela).


parei pra ler sobre
o festival
em São Paulo
tem muitos
essa semana:

paralaxe
coleção de lápis
percussão para pais e filhos
escambau
machismo, mitos e costumes cristãos
arte e tecnologia
abra a janela antes de começar

sobre como essa
planta parece falsa
essa planta parece
seca essa
planta
parece
um
teste.



sobre como o poema
se parece
com um jogo

de esconde-
esconde

de
relacionamentos

de pôquer.


Uma diminuição na produção das rosas
Diminui acidentes.


sobre como eu não poderia escrever
isso
sem essa
caneta


sobre como quase dormindo
as ideias
vem
                     

sobre como dormir com gatos
sobre como acordar com gatos
sobre vasos quebrados
sobre vasos no chão
sobre comer flores
sobre comprar roupas no inverno
sobre ir ao banheiro no inverno
sobre como um teste.

________

juno cipolla cursa letras na usp e prepara o seu primeiro livro de poemas

tenho postado uma série de poemas-que-conversam-com-um-teste de resistores
para ler os outros textos clique aqui 


sexta-feira, 8 de maio de 2015

Um açaí de resistores / um teste de açaí – Dimitri BR





















I.
leio no Rio o que marília escreveu
em são paulo            ou por são paulo
por ter ido morar em são paulo
já morei em são paulo somos mais cariocas 

que no Rio         eu e marília       (e o victor) 


II.
atravesso a avenida em direção ao mar
um carro quase me atinge        um turista
se assusta               eu não
ser atropelado não está nos planos
do carioca        por acaso       em direção ao mar 



III.
vivo         em frente ao mar
escrevo: é inexato afirmar
que cariocas atravessam a rua
fora dos sinais de trânsito
para isso seria preciso
que cariocas admitissem a existência de sinais de trânsito 




IV.
retomo o livro no ponto exato
onde havia parado        marília
escreve: eu acho que aqui em são paulo
as pessoas costumam atravessar a rua na faixa de pedestres 

eu acho que aqui em são paulo
as pessoas não têm a mania
de atravessar a rua no meio dos carros 



V.
o primeiro livro de marília se chama
encontro às cegas
quando ela escreveu esse livro      no Rio
eu morava                            em são paulo
apresentei marília a ricardo
meses depois num assalto frustrado
(eu e ricardo)
não deixei levarem o primeiro livro da marília
agora ricardo dorme     na casa de cristina    à beira-mar 



VI.
dizer que sou carioca por acaso
é inexato
para isso seria preciso
que paraenses não atravessassem o Rio em direção ao mar



VII.
quando criança lastimava a falta
de açaí                              no Rio 

quando adolescente o cabelo da marília 
foi azul                             no Rio
como saber se a cor que eu vejo
é a mesma cor que você vê? 


VIII.
o mais recente livro da marília se chama 

um teste de resistores
a cor da capa deve ter um nome
e um código pantone e uma fórmula 

química e coordenadas CMYK e RGB 
pra mim tem cor de açaí
quando foge de atropelamento 


_____________


há alguns meses 
eu tinha prometido reunir aqui 
poemas           textos vídeos leituras
em diálogo com um teste de 
resistores

alguns percalços        no meio do caminho

e certo atraso        
                      mas enfim recomeço a postar
eu tinha começado com um poema do thiago galego, aqui
e retomo com este do dimitri br

agradeço os autores pelo diálogo!